quinta-feira, 17 de abril de 2014

A Páscoa e o Ovo


De vez em sempre me pego na mesma auto indagação. Será que estamos providenciando a educação de nossos filhos com os corretos valores. Tenho tentado sempre ensinar-lhes o que meus pais há tanto já me ensinaram, assim como os pais deles em épocas mais remotas. Quando me aquieto com uma resposta positiva, pois sempre tento lhes passar o que é correto, me pego naquela segunda indagação. Quais são os valores realmente corretos? Se é difícil eleger ou apontar os corretos valores a serem vividos, talvez o inverso seja uma tarefa menos árdua. O errado, indiscutivelmente não é o certo.

Munida desse espirito educativo vi-me sentada à mesa com meu filho mais novo, hoje com 4 anos, e a nossa frente a tarefa de casa sobre a Páscoa.

A tarefa, destinada também aos pais, envolvia uma conversa acerca do significado da Páscoa para depois a criança desenvolver um desenho que retratasse os ensinamentos recém adquiridos. Então começamos. Páscoa: ovo, coelho, chocolate... Todo ano a mesma coisa. E  sempre me vejo diante da incerteza do significado de cada um desses símbolos e da influência mercadológica e consumista que paira sobre eles. Esses não parecem refletir os corretos valores a serem abordados. E a Páscoa, então? Com abordá-la? Sobrou-me a ressurreição de Cristo ou êxodo do povo hebreu do Egito.

Escolhi a primeira estória. Deixei de lado o coelho, o ovo e o chocolate pelas razões já apontadas e comecei: Era uma vez um homem muito bonzinho que só praticava o bem e ajudava as pessoas. Seu nome era Jesus. Mas havia algumas pessoas muito más que fizeram maldade a ele e acabaram pregando Jesus em uma cruz. Jesus morreu crucificado e depois foi enterrado em uma tumba ..... A essa altura, considerando que minha estória tinha um pouco mais de floreio, já dava para observar os olhos assustados e talvez até indignados de meu filho: mas ele morreu, mamãe. Sim, Pedro, ele morreu... Continuei: depois que Jesus foi enterrado ele ressuscitou... Ele o que mamãe? Ele ressuscitou Pedro, ele viveu novamente ( assegurei-me em deixar muito claro que somente Jesus e personagens de vídeo game têm esse poder) e em seguida Jesus foi para o céu se encontrar com Deus. Finda a estória, conclui vitoriosa: e na Páscoa nós comemoramos a ressurreição de Cristo, o dia em que ele viveu novamente e foi para o céu.

Certa do dever cumprido, de ter bravamente resistido ao achocolatado sabor desta data, prosseguimos à segunda etapa da tarefa escolar. Observei o desenho que meu filho atentamente construía e que deveria retratar nossa conversa. A julgar pelo seu interesse amplamente manifesto pelo desenrolar da estória, certamente o desenho resultaria em uma cruz, ou uma garatuja que ele apontaria como sendo Jesus. Curiosa, esperei pacientemente os rabiscos se encontrarem em figuras que, embora desconexas para mim, para ele faziam todo o sentido. Acabei! Proclamou o garoto. Deitei meus olhos sobre a folha branca e vi algo parecido com uma ameba marrom e próxima a ela outras amebas menores azuis e verdes. Havia ainda alguns outros rabiscos assemelhados a ampliações de seres microscópicos que circundavam o desenho. O que meu filho teria desenhado? A tumba? A cruz? Os homens maus? Desisti de interpretar o abstratismo que jazia sobre a mesa e disse-lhe: Que lindo Pedro! O que você desenhou? Ele, orgulhoso do desenho, mostrou-me os valores aprendidos e com um enorme sorriso nos lábios decretou: é o brinquedo que vem dentro do ovo mamãe!


Hoje eu perdi. 
(ilustração extraída de 
"http://falaremverdade.blogspot.com.br/2011/04/
e-por-falar-em-verdade-coelhinho-da.html")