A semana fora quente, colorida e
ensolarada. A previsão do tempo não revelava o mesmo padrão para o iminente
final de semana. De regra tal fato não chamaria nem de longe sua atenção,
afinal mais de trinta anos vivendo na imprevisível Curitiba tornaram essa
mudança de tempo comum.
Mas nesse final de semana em particular o tempo a
atormentava. É que o marido decidira levar
o filho de 7 anos para acampar... no Pico do Marumbi.
Tentou dissuadi-lo da ideia que lhe
parecia de jerico. Fora em vão. Ele revelou, para surpresa da esposa, o improvável: podia ser
mais teimoso que ela. Embora ele dissesse que a atitude não revelasse teimosia
e sim determinação, era teimosia sim. E isso ela teimava em afirmar.
Enfim chegou o sábado. Dia quente e
abafado. O bafo do ar era como o sopro de Deus avisando a todos que a chuva
viria. Pois sequer isso foi eficiente para afastar a tal “determinação” do
marido. E, bem da verdade, sequer poderia ser diferente ante a excitação do
menino, já cuidadosamente trajado de escoteiro, cantil a tiracolo, lanterna em
punho e vários pacotes de guloseimas ordinariamente proibidas enfiadas na
mochila. E assim foram os dois desbravadores rumo àquela que se apresentava
como uma desastrosa aventura.
Sempre achei que toda mãe fosse um
pouco vidente, capaz de prever o futuro. Se estiver errada é porque talvez
todas sejam meio bruxas, capazes de influenciar o futuro. Assim digo porque
dito e feito. Choveu, e choveu muito. São Pedro resolvera fazer a faxina do
ano! Ela não conseguia parar de pensar no entrevero que estaria sendo a
aventura de seus homens. Já o marido não conseguia parar de tentar encontrar uma
desculpa, justificativa ou qualquer outra coisa razoável para evitar o que
seria o inevitável comentário: “eu te disse!” Ele não poderia dar o braço a
torcer, tudo menos isso. Claro que não encontrou! A esposa venceria.
Mas como disse, tudo menos vencido.
Tratou de ter uma conversa de homem com o filho. Olhou-lhe nos olhos, e,
esforçando-se para diferenciar a mentira da necessidade disse-lhe:
- Filho, não
vamos contar à mamães que choveu, tudo bem? Não precisa dizer nada, só não
vamos contar que choveu!
O filho, cúmplice nato do pai, pareceu entender e de
imediato e com entusiasmo concordou, selando uma aliança que certamente
traduziria no futuro a base de uma relação duradoura e recíproca de amor e
devoção paternal.
Mas algumas coisas na vida têm a perna
curta.
Chegaram em casa sorrateiros e sem a
esposa notar jogaram a roupa molhada no tanque na esperança velada de que somente
a diarista no dia seguinte visse. Mas as mães têm olhos de águia. Enxergam
tudo. Claro que ela viu a roupa entulhada, molhada e coberta de lama. Torceu o
nariz, rodeou o filho, fez-lhe um carinho sobre os cabelos e dirigiu-lhe
algumas perguntas inocentes, todas prontamente respondidas com detalhes
minuciosos. Em seguida e repentinamente indagou-lhe, de forma firme mas
despretensiosa:
- Filho, choveu no acampamento?
Ao contrário da reação do menino
para o interrogatório anterior, para esta indagação não só ficou calado, como
também imóvel. Com o pescoço duro, movia somente os olhos, tentando com o canto
do olho avistar seu cúmplice, tal como reagiria o prisioneiro capturado que
anseia pelo resgate improvável. Contudo, o resgate não veio!
O filho, sem outra alternativa, mas
decidido a não entregar o aliado, rendeu-se a pergunta da mãe e, mostrando que
a mentira tanto pode diferir como se confundir com a necessidade, disse-lhe:
- Não,
mamãe, não choveu, a gente só ficou um pouco encharcado.
Ela não pode conter o riso. Não só
pela graça do momento que revelava a criatividade do pequeno e a lealdade para com
o pai, mas também porque ao final ela poderia dizer ao marido: Eu te disse!
Minha amiga, não sei se foi assim, mas
foi assim que vi acontecer!
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