segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Primeiro Amor


As quatro anos de idade meu filho mais velho mudou de escola. Até está idade frequentava uma escola adorável, em outro bairro da cidade. Professoras dedicadas, ambiente agradável e uma coordenação impecável. Eu adorava a escola quase tanto quanto ele, pois ele realmente a amava.
Começou a frequentá-la com dois anos. Portanto, ficou lá por outros dois. Embora não pareça muito tempo, certamente muita coisa aconteceu em sua vida nesse curto período, e entre elas meu pequeno conheceu seu primeiro amor: uma doce menininha chamada Fernanda, a Nanda.
Era uma graça, claro que não tanto quanto ele, mas era formosinha. Seu amor pela garotinha era recíproco. Certa vez deu-lhe um anel de plástico de presente, parecido com aqueles que vinham em sacos de pipoca doce. Ela se encantou. Mulher gosta de joia! Ela não o tirou do dedo por mais ou menos duas semanas. Depois disso não sei bem o que aconteceu, pois não mais exibiu o apetrecho. Talvez o tenha engolido e nessa hipótese certamente a mãe não deve ter se interessado em resgatar o badulaque.
Em retribuição ao presente ela lhe deu um ioiô. O brinquedo também sumiu depois de um tempo. Não, meu filho não o engoliu, era muito grande para isso e especialmente para o passo seguinte. Era verde, do Ben 10. Ele ainda não conhecia o personagem, mas sabia precisamente quem o lhe dera, a doce Nanda, e isso o deixava muito feliz.
Findo o ano e as férias escolares de verão, iniciava-se a nova experiência de meu menino na outra escola. Estrearia no Colegião. Confesso que me surpreendi, pois adorou a escola nova, quase tanto quanto a antiga. Era grande, colorida, alegre.
Mas as lembranças do amor não abandonam facilmente um homem e, mesmo que eu lutasse para libertá-lo, as memórias de Fernanda persistiam incrustadas em seu ingênuo coração.
Já algumas semanas depois, voltávamos do Colegião e meu pequeno se mostrava alegre, radiante com os novos amigos e em especial com outra doce menina, Laura. Bem que minha mãe já dizia que nada nessa vida é insubstituível. Nisso Laura veio a calhar.
Animada pelo progresso sentimental de meu pequenino, certo dia, regressando da escola, tratei de perguntar-lhe, muito discretamente, sobre Laura. Os olhos brilhavam entusiasmo enquanto ele descrevia seus dotes e qualidades. Mas repentinamente, como em um arroubo de melancolia, seus olhos se apagaram, se acinzentaram. Estávamos no carro e pelo espelho retrovisor pareceu-me uma lágrima de tristeza a escorrer-lhe pelos olhos. Olhei melhor, quase bati o carro, mas percebi, para minha felicidade, que não passava de um pequeno feixe de luz em sua face.
Embora não chorasse, é certo que ele sentia falta da garota. Lentamente levantou a cabecinha fitando-me, de trás do carro, pelo espelho e desabafou:
- É mamãe, a Fernanda não mudou de escola. Que pena! Que pena que não deu tempo!
“Não deu tempo? Não deu tempo de que?”, pensei. Curiosa, verbalizei a pergunta e ele, para meu desespero, completou o desabafo anterior:
- Não deu tempo da gente se casar, mamãe!
Quase enfartei. Senti um formigamento no braço e uma trincada no peito. Meus olhos ficaram turvos e por uma fração de segundo percebi que em algum momento no futuro próximo  aquele serzinho não será mais meu. Será? Perguntei-me, afinal ainda só tem quatro anos.
Meio sem fôlego, engasgada pela saliva, procuro avidamente o que lhe dizer. Sim, pois o momento não poderia ficar sem uma resposta. Mas dizer o quê? Antes tivesse pensado mais e melhor, pois o calor e o desconforto daquele instante me fizeram atirar-lhe as seguintes palavras:
- Casar com a Fernanda pra quê? Você pode se casar com a mamãe!
“Nooossa, que idiota!”, pensei. Cheguei a corar diante do tamanho despautério. Ainda bem que ele ainda não percebe esse tipo reação. Contudo, há coisas que a vida trata de ensinar ela mesma, sem as intervenções nada inteligentes das mães. Com lucidez e serenidade meu filho retruca, quase me repreendendo:
- Mas mamãe, eu não posso me casar com você porque você já tem um papai!
Faz sentido. De fato já sou casada com o pai dele. Mas não desisto de meu filho. Jamais poderia perder a batalha para a minha primeira adversária, Fernanda. Lembro-me de Laura e ensino a meu filho, desta vez muito mais sabiamente, que a fila anda e digo-lhe:
- Meu amor, a Fernanda é passado.
Ele enfim concorda e assente dizendo:
- É ... ela já era.

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